Antes do Baile verde é um livro de contos de Lygia Fagundes Telles, escritora da qual eu gosto muito.
Os contos são muito interessantes, sempre fazem referência ao verde e muitas vezes se autorreferenciam.
Quando
 penso em verde, penso em olhos e penso em jade. Jade é a pedra que me 
chamou mais atenção, quando eu fui em uma exposição cultural da China. E
 olhos verdes, foram os olhos de uma menina que se sentou ao meu lado, 
quando eu tinha 16 anos.
A exposição da China era sobre os
 Guerreiros de Xian. Mas o que me chamou atenção nessa exposição foi um dragão esculpido em
 jade... Era de um verde muito marcante. Era um verde que me 
fazia lembrar de seus olhos.  
Essa menina rompeu o
 meu cotidiano... todos os dias eu pegava o mesmo ônibus durante 1 ano e
 meio..E nesse um ano e meio os passageiros eram sempre os mesmos. Dentro disso só a minha tristeza não era passageira. 
O motorista era um cara frio e 
amargo que dava freadas bruscas... seu estado de espírito se refletia no modo como ele guiava....quantas vezes não caí, pego no 
contrapé de suas barberagens. 
Era uma época onde eu me sentia preso sem entender o que se passava comigo... 
todas os lugares que eu frequentava tinham ares de repressão. A escola, o
 esporte que era obrigado a fazer e o meu próprio lar.
Quando vc 
não sabe lidar com a situação, ou vc procura uma solução, ou vc se 
anula. Sem saber o que fazer, eu me anulei. 
Foi quando ela entrou...usava o mesmo uniforme que o meu. 
Olhei de maneira discreta...aquilo era uma garota ou era um anjo? 
Entrou
 a passos lentos, como que reconhecendo o território. Respirei fundo e 
suspirei, meu peito trancado não permitiu que entrasse ar. Alegria ou 
perturbação? ou os dois?
O ônibus acabara de 
esvaziar... muitos bancos vagos. Eis que ela se senta ao meu lado. 
No ano anterior 
eu tive uma boa temporada. Praticamente ganhei todos os campeonatos 
possíveis. Porém aquilo não tinha valor algum para mim. Trocaria todas as vitórias por um lapso de consciência. O ritmo forte dos treinos, trocaria
 pelo balanço de uma música alegre 
Infelizmente
 o exemplar do livro Antes do Baile Verde que eu tinha, que era 
antigaço, comprado num sebo, emprestei para um amigo que não irá me 
devolver. Lá tinha o conto Olho de Vidro, um conto que não se encontra mais 
nas edições atuais.  De alguma maneira a Lygia renegou esse conto... uma 
pena, gostava tanto dele, procuro na internet e não acho.
Conta a história de um 
detetive que investiga relações extraconjugais. Aos poucos no conto, vc 
vai descobrindo que o primeiro caso que ele investigou foi o próprio quando desconfiou que sua mulher o estava traindo....  e 
fez disso uma profissão.
Segui em silêncio durante o 
trajeto inteiro... com uma timidez  me calando e minha cabeça girando... Meus olhos fingiam estar preocupados com a paisagem exterior.. por fora a cidade adormecida, comércios ainda fechados, as pixações nos portões das lojas...Por dentro meu espírito desperto, sentindo sua presença, o perfume, o calor de seu corpo...
como nunca havia visto aquela garota na escola? Quem era 
ela? Bastaria perguntar... mas palavras não sairiam da minha boca.
Algumas
 chinesas se interessaram por mim, quando eu estava no Japão. Eu ficava 
com pé atrás, pois, achava que elas estavam interessadas apenas em 
conseguir visto permanente mediante a uma relação comigo. Jamais pensava que alguém poderia se 
interessar por alguma qualidade minha. Eu sempre na defensiva, desconfiado e de coração fechado.
Nem falava chinês nem japonês, a única comunicação 
possível seria na cama.... a 
linguagem universal - uma vez disse uma prima minha.
Falou em China, lembro dessa exposição. Lembro de jade, lembro dos olhos verdes. 
Outro
 dia vi uma vlogueira fazendo uma resenha sobre o livro Antes do Baile Verde... 
Dizendo que seu exemplar foi comprado em sebo. Mandei uma mensagem pra 
ela pedindo o conto Olho de Vidro, mas a canalha nem me respondeu. Tá se
 achando demais, ou simplesmente não dá o feedback. Esses dias ela 
postou uma foto ao lado da Lygia, sigo-a nas redes sociais. Ela 
participou de um doc em homenagem aos 1000 anos da Lygia, ou melhor, aos
 90 anos..hehehee... Nem vi esse doc, passou na cultura... hj eu não 
assisto mais televisão. Procurei e ainda não postaram no youtube.
Sofri uma contusão séria... 
foram dois dias de treinos fortes.. mas na verdade um desgaste de uma vida inteira. O cansaço vai penetrando durante os anos, na pele, depois nos músculos depois nos ligamentos e enfim na alma. 
Foram tantos anos de treinos forçados, contra a minha vontade... um dia 
eu iria enlouquecer, mas deixaria isso pra depois que eu voltasse do 
Japão. Quando me machuquei sério, o técnico me disse... ou vc está com 
problemas ou vc está apaixonado. Eu estou é de saco cheio!! - Pensei.
Logo me lembrei daqueles verdes 
olhos... no dia seguinte veria ela de novo.
Andei 
mancado para o ponto de ônibus... dia cinzento para quem estuda de 
madrugada, horário de verão. Coração frio e corpo machucado. Ela entrou... 
Todos os dias o ritual era o mesmo. Naquele exato ponto, de longe a via sinalizar para o motorista parar.  
O
 desgraçado freava brusco...
Mas ela entrava levitando... e 
sorria pra ele todos os dias.
Será que aquele sorriso dobrava o mal humor dele? Se não, não importava. Eu roubava o sorriso e guardava no coração.   
Quando
 voltei do Japão caí numa depressão profunda... tudo o que havia varrido
 pra baixo do tapete veio a tona. Anos frequentando aquele grupo 
esportivo fazendo por obrigação algo que eu detestava. Violência 
psicológica e física em casa. Bullyng na escola. Que diabos...
Fugi para leitura, busquei por meditação, busquei por medicação. Joguei as medalhas  no lixo, mas não tirei o trauma do coração...
Nas
 minhas leituras, enfim, descobri esse livro de contos da Lygia.. Antes 
do Baile Verde...Talvez eu preenchesse o conto Olho de Vidro, por, Olhos
 Verdes de Vidro. Ou mudaria o título para Antes dos Olhos Verdes..
Aos poucos 
fui me desligando.. depois que me machuquei sério, não fui o mesmo 
atleta. Um dia me ligaram não pra saber como eu estava, mas se eu tinha 
melhorado para voltar aos treinos. Precisavam de mim para completar a equipe  numa corrida de rua.  Canalhice total. Quando voltei aos 
treinos, não era mais o mesmo. Estava cansado de tudo aquilo. De corpo, 
mente e coração.
Enfim, nessa época estava acabando mais 
um ciclo, Parece milagre, mas as coisas passam. Até as coisas ruins 
passam. Até as prisões se desmancham. As marcas podem ficar no coração, 
mas a gente aprende ou pelo menos tenta apagar. 
Quando me recompus 
no físico, ela não mais pegava o mesmo ônibus. Aquele período tbém 
passou. Sem aquele sorriso, tudo perderia o brilho. Sem aqueles olhos, a rotina perdeu a cor. Aquilo foi um 
pequeno milagre do cotidiano. Aquilo foi realmente a única coisa que 
quebrou o meu cotidiano. 
Um presente da vida.
Como nos contos da Lygia, essa história poderia terminar sem final, em aberto. Ali quem dá o fechamento da história é o leitor. 
Mas aqui quem decide é a ficção, a realidade ou o coração?
A diferença é que os personagens dessa ficção são reais e participam da história. Como o escritor de memórias eu não decido nada. Ainda tenho medo de tomar um rumo. 
Falando em ciclos e términos... sinto que enfim, a depressão tbém está se diluindo. Este é o momento de nascimento, ou de um renascimento.
Que toquem as trombetas, que caiam as bençãos e desçam os anjos. 
Na minha cabeça tocam  duas músicas do Angra, Rebirth e Nova Era... E que irônico!! Comprei esse Cd no Japão, com encarte em Kanjis e tdo mais.
"Brilha o novo dia, anjos caídos se levantarão
Nova Era traz as cinzas de volta à vida
Tudo acabado, as dores e mentiras
Anjos se erguerão
De volta à vida!"
E no fim de Rebirth diz...
"(E eu) Vou pelos ventos de um dia novo em folha
Alto aonde as montanhas alcançam
Reencontrei minha esperança e orgulho
Renascimento de um homem
Hora de voar..."
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